CIR.CUNS.TAN.CIAL AX.N1

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Bem, eis assim uma daquelas colaborações que nunca julguei vir a acontecer e que é um tanto quanto peculiar. Parece que Miguel Korreia, esse tal diretor da Fanzineteca de Aveiro e igualmente editor da Ultra Violenta, achou que seria uma boa ideia chamar a cir.cuns.tan.cial para esta mistela de palavras e imagens. Não consigo evitar um sorriso cínico com essa escolha. E assim chega o momento em que deveria partilhar o meu entusiasmo (ou falta dele) com esta colaboração única. Uma colaboração diferente, no entanto. Aqui, jovens estudantes da área artística juntar-se-ão à festa. Eles podem ser os cães sarnentos famintos de um festim maluco que servimos, ou talvez, quem sabe, eles nos ensinem algo que nos tenha passado despercebido todos estes longos anos.

Então, aqui está a situação: os jovens artistas serão os cérebros por trás das capas, enquanto a mim foi confiada a tarefa do “miolo”. A ironia, é claro, não passa despercebida. Enquanto eles cuidam das carcaças, eu, cavo fundo nos miolos da coisa. A verdade é que esta colaboração é um ato de masoquismo editorial. Quem sabe o que eles vão criar? Serão capas que se harmonizarão maravilhosamente com as palavras que cuidadosamente escolhi? Ou serão aberrações visuais que farão os leitores se questionarem sobre o que raio estão prestes a consumir?

O que posso dizer sobre as capas que estão prestes a nascer? A resposta honesta é: não faço a mínima ideia. Eu, o suposto homem das palavras, fui excluído desse processo. Talvez isso seja uma sábia decisão, já que a minha apreciação por estética e design é notoriamente limitada. Mas não se enganem, não estou ansioso para abraçar capas que podem muito bem me deixar perplexo, indignado, ou até odiando-as com todo o meu ser. Afinal, quando se coloca nas mãos do sangue novo a criação, estamos a pactuar com o desconhecido.

Enfim, a cir.cuns.tan.cial sempre teve um gosto pelo lado sombrio da arte. Acredito que a responsabilidade do artista é irritar, questionar, e desafiar aqueles que preferem viver no mundo superficial. A filosofia que guia a cir.cuns.tan.cial sempre foi a de dar voz aos que, de outra forma, permaneceriam em silêncio. Damos-lhes voz ora porque lhes atafulhamos a garganta de verbo, ora porque lhe disponibilizamos espaço útil para aqui despejarem o que os intriga. Nós, como artistas e poetas, entendemos a responsabilidade que carregamos nas palavras que escolhemos, nas imagens que tecemos, e nas estórias que contamos. Já vocês, leitores, têm a tarefa de absorver, interpretar e até mesmo distorcer o que apresentamos. Esta é uma orgia literária onde ninguém sai ileso. Então?, vá lá, pega nas nossas palavras, mastiga-as, engole-as ou cospe-as. Este é um jogo sem regra, onde a única constante é o caos. Se apreciares, ótimo; se não, bem, isso também é ótimo. Afinal, a vida é uma coleção de absurdos, e esta colaboração é apenas mais um capítulo.

Todavia, assim como tu, leitor, estou disposto a ser surpreendido. Se as capas forem feias, estranhas ou inaceitáveis, é provável que eu as odeie mais ou menos secretamente. E se forem obras-primas, fingirei que as apreciei desde o início. No final do dia, a arte é subjetiva, e a beleza está no olho do espetador. Ou, neste caso, do leitor. Então, que venham as capas, seja como for. Vamo-nos preparar para abraçar o desconhecido e esperar que ele não seja assim tão assustador quanto parece… bem, talvez eu deva ir praticando a minha expressão de choque.

com o cinismo de sempre e uma ponta de expectativa

- anónimo coroado, X 12 2023

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